COTIDIANO OPINIÃO MENSAGENS RECLAMAÇÕES

A HISTÓRIA DO LÁPIS E OUTRAS CRÔNICAS DE PAULO COELHO.

O menino olhava a avó escrevendo uma carta. A certa altura, perguntou:
- Você está escrevendo uma história que aconteceu conosco? E por acaso, é uma história sobre mim?
A avó parou a carta, sorriu, e comentou com o neto:
- Estou escrevendo sobre você, é verdade. Entretanto, mais importante do que as palavras é o lápis que estou usando. Gostaria que você fosse como ele, quando crescesse.
O menino olhou para o lápis, intrigado, e não viu nada de especial.
- Mas ele é igual a todos os lápis que vi em minha vida!
- Tudo depende do modo como você olha as coisas. Há cinco qualidades nele que, se você conseguir mantê-las, será sempre uma pessoa em paz com o mundo.
“Primeira qualidade: você pode fazer grandes coisas, mas não deve esquecer nunca que existe uma Mão que guia seus passos. Esta mão nós chamamos de Deus, e Ele deve sempre conduzi-lo em direção à Sua vontade”.
“Segunda qualidade: de vez em quando eu preciso parar o que estou escrevendo, e usar o apontador. Isso faz com que o lápis sofra um pouco, mas no final, ele está mais afiado. Portanto, saiba suportar algumas dores, porque elas lhe farão ser uma pessoa melhor”.
“Terceira qualidade: o lápis sempre permite que usemos uma borracha para apagar aquilo que estava errado. Entenda que corrigir uma coisa que fizemos não é necessariamente algo mau, mas algo importante para nos manter no caminho da justiça”.
“Quarta qualidade: o que realmente importa no lápis não é a madeira ou sua forma exterior, mas o grafite que está dentro. Portanto, sempre cuide daquilo que acontece dentro de você”.
“Finalmente, a quinta qualidade do lápis: ele sempre deixa uma marca. Da mesma maneira, saiba que tudo que você fizer na vida irá deixar traços, e procure ser consciente de cada ação”.

O homem e as oito forças


Para praticar a Arte da Paz, é preciso, em algum momento, mergulhar alternadamente nas oito forças opostas que sustentam o Universo:
- Movimento e inércia
- Solidez e adaptação
- Contração e distensão
- Unificação e divisão
Isso está presente em tudo, da vastidão do espaço à menor das plantas; cada coisa traz em si uma reserva gigantesca da energia universal, que pode ser usada para o bem de todos.

ter, 28/12/10
por Paulo Coelho |
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Quem é o mestre mais poderoso?


Um dos discípulos de Yu estava conversando com um discípulo de Rinzai:
“Meu mestre é um homem capaz de fazer milagres, e por causa disso é respeitado por todos os seus alunos. Eu já o vi fazer coisas que estão muito além de nossa capacidade. E o seu mestre? Que grandes milagres é capaz de realizar?”
“O maior milagre do meu mestre é não precisar mostrar nenhum prodígio para convencer aos seus alunos que é um sábio”, foi a resposta.

seg, 27/12/10
por Paulo Coelho |
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Manual de conservar caminhos IV


A natureza segue suas próprias regras: desta maneira, você tem que estar preparado para súbitas mudanças do outono, o gelo escorregadio no inverno, as tentações das flores na primavera, a sede e as chuvas de verão. Em cada uma destas estações, aproveite o que há de melhor, e não reclame das suas características.
Faça do seu caminho um espelho de si mesmo: não se deixe de maneira nenhuma influenciar pela maneira como os outros cuidam de seus caminhos. Você tem sua alma para escutar, e os pássaros para contar o que sua alma está dizendo. Que suas histórias sejam belas e agradem tudo que está a sua volta. Sobretudo, que as histórias que sua alma conta durante a jornada sejam refletidas em cada segundo de percurso.
Ame seu caminho: sem isso, nada faz sentido.

dom, 26/12/10
por Paulo Coelho |
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Manual de conservar caminhos III


Cuide do caminho, antes de cuidar do que está a sua volta: atenção e concentração são fundamentais. Não se deixe distrair pelas folhas secas que estão nas margens, ou pela maneira como os outros estão cuidando dos seus caminhos. Use sua energia para cuidar e conservar o chão que acolhe seus passos.
Tenha paciência. Às vezes, é preciso repetir as mesmas tarefas, como arrancar ervas daninhas ou fechar buracos que surgiram depois de uma chuva inesperada. Não se aborreça com isso, faz parte da viagem. Mesmo cansado, mesmo com certas tarefas repetitivas, tenha paciência.
Os caminhos se cruzam: as pessoas podem dizer como está o tempo. Escute os conselhos, tome suas próprias decisões. Só você é responsável pelo caminho que lhe foi confiado.

sáb, 25/12/10
por Paulo Coelho |
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Honre seu caminho. Foi sua escolha, sua decisão, e na medida que você respeita o chão onde pisa, também este chão passa a respeitar seus pés. Faça sempre o que for melhor para conservar e manter seu caminho, e ele fará o mesmo por você.

Esteja bem equipado.
Leve um ancinho, uma pá, um canivete. Entenda que para as folhas secas os canivetes são inúteis, e para as ervas muito enraizadas os ancinhos são inúteis. Saiba sempre que ferramenta utilizar a cada momento. E cuide delas, porque são suas maiores aliadas.
O caminho vai para frente e para trás. Às vezes é preciso voltar porque foi perdido algo, ou uma mensagem que devia ser entregue foi esquecida no seu bolso. Um caminho bem cuidado permite que você volte atrás sem grandes problemas.

sex, 24/12/10
por Paulo Coelho |
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Manual de conservar caminhos I


O caminho começa em uma encruzilhada. Ali você pode parar e pensar em que direção seguir. Mas não fique muito tempo pensando, ou jamais sairá do lugar. Faça a clássica de Castañeda: qual destes caminhos tem um coração? Reflita bastante sobre as escolhas que estão adiante, mas uma vez dado o primeiro passo, esqueça definitivamente a encruzilhada, ou sempre ficará sendo torturado pela inútil pergunta: “será que escolhi o caminho certo?”
Se você escutou seu coração antes de fazer o primeiro movimento, você escolheu o caminho certo.
O caminho não dura para sempre: É uma benção percorrê-lo durante algum tempo, mas um dia ele irá terminar, portanto esteja sempre pronto para despedir-se a qualquer momento. Por mais que você fique deslumbrado por certas paisagens, ou assustado com algumas partes onde é necessário muito esforço para seguir adiante, não se apegue a nada. Nem às horas de euforia, nem aos intermináveis dias onde tudo parece difícil, e o progresso é lento.
Cedo ou tarde um anjo virá, e sua jornada chega ao final, não esqueça.

qui, 23/12/10
por Paulo Coelho |
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A importância de repetir a mesma coisa


Uma ação é um pensamento que se manifesta.
Um pequeno gesto nos denuncia, de modo que temos que aperfeiçoar tudo, pensar nos detalhes, aprender a técnica de tal maneira que ela se torne intuitiva. Intuição nada tem a ver com rotina, mas com um estado de espírito que está além da técnica.
Assim, depois de muito praticar, já não pensamos em todos os movimentos necessários: eles passam a fazer parte da nossa própria existência. Mas para isso, é preciso treinar e repetir.
E como se não bastasse, é preciso repetir e treinar.
Observe um bom ferreiro trabalhando o aço. Para o olhar destreinado, ele está repetindo as mesmas marteladas.
Mas quem conhece a importância do treinamento, sabe que cada vez que ele levanta o martelo e o faz descer, a intensidade do golpe é diferente. A mão repete o mesmo gesto, mas à medida que se aproxima do ferro, ela compreende que se deve tocá-lo com mais dureza ou mais suavidade.
Observe o moinho. Para quem olha suas pás apenas uma vez, ele parece girar com a mesma velocidade, repetindo sempre o mesmo movimento.
Mas aquele que conhece os moinhos sabe que eles estão condicionados ao vento, e mudam de direção sempre que for necessário.
A mão do ferreiro foi educada depois que ele repetiu milhares de vezes o gesto de martelar. As pás do moinho são capazes de se moverem com velocidade depois que o vento soprou muito, e fez com que suas engrenagens ficassem polidas.
O arqueiro permite que muitas flechas passem longe do seu objetivo, porque sabe que só irá aprender a importância do arco, da postura, da corda, e do alvo, depois que repetir seus gestos milhares de vezes, sem medo de errar.
Até que chega o momento em que não é mais preciso pensar no que se está fazendo.
A partir daí, o arqueiro passa a ser seu arco, sua flecha, e seu alvo.

qua, 22/12/10
por Paulo Coelho |
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O velho fadista


(enviada por Cristina Santos)
A varanda de minha casa está virada a poente, por isso tem a vantagem de em dias claros, de inverno ou verão, receber a luz do sol durante quase toda à tarde.
Certa manhã ocupava-me das tais tarefas domésticas, quando vi a figura humilde e andrajosa de um homem; se não era muito idoso, estava maltratado pela vida e pelo tempo.
Para se deslocar recorria à ajuda de muletas, pois uma das pernas estava atrofiada. E me impressionou porque mesmo assim ainda conseguia transportar uma velha guitarra clássica!
Sentou-se em um bar em frente e começou a cantar. Assim que escutei a sua voz, estremeci! Era tão bela, como a de um anjo sereno e abençoado, embora triste. Aos poucos preencheu todo o ambiente, ecoou nas paredes, envolveu-me, elevou-me…
Percebi minhas lágrimas involuntárias que rolavam para o chão, pressenti as pessoas emocionadas que acorriam às varandas.  E as crianças estupefatas e maravilhadas que já não brincavam…
Compreendi que vivia um momento de efêmera eternidade, de comunhão com outras almas, como se por magia estivéssemos sidos chamados à outra dimensão, a um universo mais belo, onde talvez tudo fizesse sentido…
Ou talvez não!
Por fim, a sua voz calou-se e ficou um silêncio que tinha gosto de vazio, quase opressivo, mas logo as palmas troaram efusivas, os sorrisos iluminaram e as crianças gritaram bis entusiasmadas.
No entanto, o homem, como que completada a sua missão, preparou as muletas e continuou seu caminho.
Saí correndo e só descansei quando o alcancei, esbaforida. Era tão óbvio deduzir que o fado era o seu ganha-pão, que sem hesitar lhe apertei uma nota na mão, mas juro que foi apenas, quando comovida, o abracei e lhe pedi que nunca mais parasse de cantar, e o seu rosto enrugado e cansado se suavizou… e me sorriu!
Não voltei a vê-lo, mas quero acreditar que continua por outros caminhos, a chorar o seu fado, a cumprir a sua missão. Se por acaso ele passar aí perto, diga-lhe, por favor, que não o esqueci.

ter, 21/12/10
por Paulo Coelho |
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A subida arriscada


Durante uma tempestade, o peregrino chega a uma hospedaria, e o dono lhe pergunta onde está indo.
- Vou até as montanhas – responde.
- Desista – diz o dono.
- É uma subida arriscada, e o tempo está ruim.
- Irei, sim – responde o peregrino.
- Se meu coração chegou lá primeiro, será fácil segui-lo com meu corpo.

seg, 20/12/10
por Paulo Coelho |
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